quarta-feira, 19 de setembro de 2012

ESTRATÉGIAS DE LEGITIMAÇÃO EM LIVROS DE UMBANDA





ESTRATÉGIAS DE LEGITIMAÇÃO EM LIVROS DE UMBANDA

Este ensaio pretende analisar as estratégias discursivas de legitimação utilizadas por autores umbandistas.

Utilizamos um corpus composto por cinco livros publicados nas décadas de 40, 50, 60 e 70. Para não congestionar o fluxo informacional do leitor, diremos o nome da obra no momento em que formos analisar ou flagrar uma dada estratégia.

Este estudo justifica-se pela necessidade que temos de perceber: como certos critérios de edição, paginação, diagramação e, principalmente, de "prefaciação" foram utilizadas pelos autores umbandistas. E saber em que medida essa ou aquela estratégia discursiva flagra, sinaliza ou comunica a alta ou baixa auto-estima do escritor umbandista - o qual escreve sobre um culto popular visto pejorativamente por autores "sérios" ou de cultos "mais nobres" em flagrantes processos de subalternização religiosa.

Para começar nossa investigação iniciamos pela obra de Candido Emanuel Felix A Cartilha da umbanda - Rio de Janeiro: Editora Eco, 1965. O nome da obra 'cartilha' - um termo do universo escolar - revela a estratégia que o autor utilizou para legitimar sua obra. Ou seja, Candido Emanuel Felix deseja que seu pequeno, mas substancioso livro (144 páginas) seja tomado pelo leitor culto como um micro-manual para o adepto de Umbanda. O autor escolheu a metodologia da pergunta e resposta, não por acaso técnica já consagrada pelo Livro dos Espíritos de Allan Kardec ou pelo estilo do espírito Ramatis. No final de sua "cartilha" o autor apresenta uma série de orações aos orixás, mas utilizando de nomes de santos católicos. Nisto o escritor revela a dependência intelectual com o culto católico, que muito se percebe até nos altares (congás) da umbanda popular ainda hoje pejada por imagens de santos católicos.

No livro de Antonio Alves Teixeira (Neto) Umbanda e suas engiras: umbandismo - Rio de Janeiro: Editora Espiritualista, 1969; vemos a foto do escritor (um mulato de cabelo penteado e usando paletó); além disso o editor achou importante informar que o escritor em questão, não só publicou opúsculos e livros de umbanda, mas também livros sobre tabuada, noções elementares de aritmética e de que o autor é professor diplomado e membro da Academia de Letras do Vale do Paraíba. Ou seja, inferimos, pelo que foi enunciado, que se Antonio Alves Teixeira fosse um pedreiro ou um engraxate o editor não teria publicado a obra.

O livro mostra também fotos dos médiuns em impecáveis trajes formais, paletós, vestidos e cabelo cortado. Ou seja, quanto mais embranqueado, urbanizado melhor. Nada de mostrar pessoas "incorporadas" por preto-velhos analfabetos e pés descalços.

No livro de AB'D' Ruanda Umbanda (catecismo) - 3ª edição. Rio de Janeiro: Aurora, 1954; o próprio subtítulo já evoca o universo discursivo do qual o autor não conseguiu se libertar: a igreja católica. O autor muito preso aos lexemas católicos cria a partir deles extravagâncias do tipo: pontos rezados, credo, mandamentos de umbanda e sacramentos de umbanda.

A obra de Alfredo Alcântara Umbanda em Julgamento (o original não informa os créditos bibliográficos) é a que revela mais claramente essa insegurança, esse problema de identidade e de subserviência do escritor umbandista. O livro é apresentado por um escritor espírita kardecista e dois médicos kardecistas. É interessante perceber nome de médicos julgando uma obra umbandista, pois se sabe que por muitos anos a medicina oficial menosprezou o saber da "medicina" umbandista, considerada como responsável por danos e enlouquecimento de pacientes.

Para concluir, pensamos que os autores umbandistas - sejam utilizando de metodologias escolar-livrescas, vocabulário católico ou usando o aval kardecista - foram e são vítimas de uma ignorância em relação ao próprio credo que professam. A umbanda é rica e complexa (basta ler um WW da Mata e Silva ou um Rivas Neto) e não precisa está pedindo esmolas ou apadrinhamento de ninguém.

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